Repassando excelente texto do RecifeResiste, relativo a situação da mobilidade do recife e o anuncio inebriantes obras viárias no recife.
"Com um pouco mais de ousadia aqui que o outro, um pouco menos ali, os dois grandes jornais corporativos da cidade comemoram a construção dos quatro viadutos na Agamenon. “O FUTURO EM 3 ANOS” diz o Diário, “O TRÂNSITO DO FUTURO” diz o Commercio (11/08/2011), num discurso onde o termo futuro figura como sujeito de um estado superior. Semelhante aos planos quinquenais na Rússia stalinista, aos 50 anos em 5 no Brasil de JK ou ao milagre econômico da ditadura militar, o “futuro em 3 anos” repete mais um capítulo do capitalismo desenvolvimentista.
A mobilidade na cidade do Recife já saturou faz muito tempo e é apenas sob um olhar muito desatento que não percebemos essa realidade. Não há mais horário pra se pegar trânsito, ele existe toda hora, os ônibus estão completamente lotados e neles ainda sofremos com o congestionamento das vias, os altos preços de suas tarifas e com a natureza violenta e desumana do tráfego viário que joga os passageiros pra lá e pra cá dentro do ônibus como se fosse um saco de batatas. O motivo desse cenário lamentável é o contínuo investimento em transporte privado e motorizado. O metrô de Recife é irrisório, não existem ciclovias ou VLT’s e ainda não se usa os rios na Veneza brasileira. E qual é o sentido de ser desse cenário se todos sabem que pra resolver o problema da mobilidade precisamos investir em transporte público e não rodoviário?
Bem, os dois jornais já citados nos dão uma dica do motivo de se estar caminhando para a barbárie. Logo abaixo da matéria do futuro o Commercio grita: “Gigantes no rastro da Fiat no Estado”. Apesar de que o secretário das cidades, segundo o Diário, diz que eles estão priorizando o transporte público nas obras da copa não é o que parece, não parece ser o que os jornais querem e não parece ser o que a grande protagonista do desenvolvimento – a fábrica da FIAT – vai encabeçar. A chegada da fábrica da Fiat no estado é a principal matéria do caderno de economia dos dois jornais por que é a principal promessa de desenvolvimento. Não se trata apenas de entender o projeto de “mobilidade” dessas duas corporações midiáticas, mas de entender o que a elite política e econômica planeja para nossas vidas, já que esses jornais são seus fiéis veículos de expressão, fazendo com que o caderno de economia pareça com o diário pessoal dos industriais relatando como andam seus negócios.
Eles deixam claro: “a Fiat vai beneficiar o estado com empregos e investimentos”. Isso por que uma montadora de automóveis precisa de várias outras fábricas satélites fornecedoras para poder funcionar e é nisso que eles apostam o surto de industrialização que vai criar vários distritos industriais, levar o desenvolvimento para o interior, criar novos empregos e deixar todos felizes para sempre. Mas me parece muito claro como se deu a negociação que convenceu a FIAT a se instalar por aqui: “Bem, Dudu, me ajude que eu lhe ajudo, gaste bilhões em estrutura viária por que se você investir num bom metrô pra quem iremos vender os carros? Pelo que consta em meus relatórios o Recife está saturado, as pessoas não aguentam mais o trânsito da cidade, então crie mais espaço para carros que eu levo o desenvolvimento para o Estado e garanto a reeleição de seu gabinete”. E assim a classe dominante está feliz para sempre.
Que tipo de retardado o secretário das cidades, Danilo Cabral, e a equipe de edição do “Diário” acha que somos para acreditar que o governo está priorizando o transporte público? Na capa do caderno de economia do diário uma publicidade de automóvel ocupa 90% do espaço, viramos a página e mais publicidade de carros, em todas as páginas, com exceção de uma, nos deparamos com essas propagandas, no Commercio tudo se repete de uma forma surpreendentemente idêntica, com uma diagramação de capa idêntica, só que dessa vez há publicidades em todas as páginas do jornal. A chegada da fiat é ovacionada, a construção dos viadutos é elogiada e legitimada perante o público através de depoimentos em favor do projeto de pessoas comuns como taxistas. Que tipo de retardado eles acham que somos?
Eu nunca entendi tão lucidamente, da janela do meu apartamento em horário de pico, o que Rosa Luxemburgo quis dizer com “socialismo ou barbárie”. A fórmula é a seguinte: para se resolver o problema da mobilidade precisamos reduzir drasticamente o número de carros, investir em transportes públicos sobre trilhos ou ciclovias, mas o capital não permite. Metrô e bicicleta não geram o consumo, a gigante cadeia industrial e consequente acúmulo de capital absurdo que os carros geram. Então pra que investir em mobilidade urbana se o que realmente importa para nossa sociedade é o progresso do capitalismo? Todo o resto é um acidente secundário.
É como se eu estivesse assistindo a minha cidade se encaminhar mais uma vez para a barbárie (quer uma imagem mais fiel da barbárie que a hora do rush?) quando teve a oportunidade de caminhar numa outra direção. Em qual outro momento teremos investimentos tão altos e tão objetivos em “mobilidade” quanto esses três anos que nos separam da copa e que estamos jogando tudo por água abaixo?
RecifeResiste!"
Um excelente texto. resume bem o embaralho caótico da mobilidade no recife, que tem escala semelhante com cidades como belo horizonte. rompemos de fato a barreira de que não há mais horário pra se pegar transito. a sua onipresença que impera degradando o espaço do cidadão e principalmente o transporte de massa. transporte público esse que na situação vivida hoje deveria ao menos ter seu devido espaço reservado, na forma corredores exclusivos (AO MENOS) nos eixos viários principais, como av. norte e corredor norte-sul, rosa e silva, rui barbosa etc.
a bicicleta surge como elemento de complemento a esse transporte e é um importante aliado. mas de fato o que caotiza a questão é o urbanismo rodoviarista, que como nessas ultimas noticias de laços viários inebriantes a enfeiar a cidade, temos também a recente expansão do elevado de joana bezerra. este elevado/viaduto está Sobre a sofrida comunidade do coque que tem um desafio na convivência diária com aquele monstro viário degradante, não inclusivo em termos de mobilidade e acessibilidade ao espaço urbano. obras como essa aliviam a reputação da prefeitura com a classe media motorizada, são remediações para um futuro cenário eleitoral. e custam aos demais cidadãos usuários do transporte público e de força humana o mais completo abandono e marginalidade de acesso ao território urbano.
importante lembrar também a supressão de rios e córregos, bem como de suas várzeas na cidade do Recife em decorrência do urbanismo rodoviarista, degradante ambiental e social.
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